Bernardo Bertolucci nos bastidores do grande vencedor da noite: "O Último Imperador". |
Em 1988, tivemos uma belíssima edição da academia com
grandes títulos selecionados. Foi uma experiência muito boa apreciar essa
edição, pois me surpreendi com vários filmes indicados (dos quais nem tinha
ouvido falar) e também trabalhos que ficaram de fora da lista.
Todos os filmes indicados tiveram seus méritos e peculiaridades que fizeram
chamar a atenção da Academia, “O Último Imperador” (9 estatuetas) foi uma das
grandes surpresas que tive, uma biografia (sempre muito bem aceita bela
academia) belíssima e muito bem construída pela equipe de Bertolucci,
merecidamente venceu no que foi indicado. Por outro lado, “Esperança e Glória”,
“Minha Vida de Cachorro” e “Adeus, Meninos” poderiam sair pelo menos com uma
estatueta naquela noite, são belíssimos filmes com temáticas muitos parecidas (a
vida aos olhos de uma criança), mas com singularidades próprias e marcantes.
Não posso deixar de falar na indicação de “Nos Bastidores da Noticia” como
Melhor Filme. Dos indicados, tiveram outros títulos como “A Era do Rádio” e até
mesmo “Adeus, Meninos” (que foi indicado como Melhor Filme Estrangeiro, na
época somente produções americanas é que concorriam para Melhor Filme) que me
agradaram muito mais. A própria não-indicação de Louis Malle como Melhor Diretor
me deixou um pouco surpreso, mas de qualquer maneira Bernardo Bertolucci
mereceu o prêmio.
Já as atuações foram um caso à parte, as vitórias de Michael Douglas e Sean
Connery serviram para coroar o grande trabalho que esses magníficos atores
apresentaram ao público com seus personagens. A singela, mas agradável atuação
de Olympia Dukakis em “Feitiço da Lua”, foi muito digna de estatueta. Mas a
grande polêmica da noite ficou por conta da vitória de Cher como Melhor Atriz,
ela como artista pop eu não conhecia;
já como atriz, em seu primeiro filme que vi, gostei muito de como ela conduziu
e interpretou seu personagem, mas vencer Meryl Streep e Glenn Close com
personagens fora de série não caiu muito bem.
Falando agora de roteiro, de certa forma eu concordo com a Academia, às vezes ela surpreende, como na vitória de “Feitiço da Lua” (roteiro original) e às vezes ela é pragmática como na vitória de “O Último Imperador” (roteiro adaptado), ambos são belos trabalhos.
No geral, eu concordo com a premiação da Academia, sempre há alguma divergência
entre filmes, indicados ou não, a verdade que listas de melhores em se tratando
da sétima arte vão ser sempre polêmicas . A Academia tem seu perfil, mas
muitas vezes ela sabe criar uma boa polêmica para o público. Contudo, gostaria
de citar alguns filmes que merecem ser lembrados mesmo tendo sido pouco
indicados, como é o caso de “Wall Street - Poder e Cobiça””, Nascido para Matar”,
“Bom Dia, Vietnã” e “Os Intocáveis”.
Olympia Dukakis vencendo o seu primeiro e - até hoje - único Oscar. |
É OSCAR OU É GRAMMY?
Com exceção de dois títulos – “Os Intocáveis” e “Era do
Rádio”, duas grandes obras – todos os outros filmes indicados em 1988 trazem em
sua produção apenas um ou outro elemento de grande destaque. A começar a
análise pela categoria principal, podemos observar uma característica curiosa:
duas comédias românticas, um drama biográfico, um thriller e um drama
apresentado através da perspectiva infantil. Essa variedade de gêneros nos leva
ao pensamento de que a Academia buscava alguma inovação, talvez um maior
reconhecimento de produções que, devido ao gênero – comédia e thriller, por
exemplo –, acabam ficando de fora da corrida pelo Oscar de Melhor Filme.
Analisando as outras categorias, percebemos outras peculiaridades:
todos os diretores são não-estadunidenses; um indicado a Melhor Ator é
italiano; um dos indicados – aliás, o vencedor - a Melhor Ator Coadjuvante é
escocês; na mesma categoria, dois atores são negros; uma das atrizes na lista
das coadjuvantes é argentina; e, por fim, um indicado a Melhor Roteiro Original
é francês. Dando continuidade às observações, veremos que a variedade de
gêneros também acontece nas outras categorias, mostrando que essa é
provavelmente a edição mais globalizada e multicultural da Academia, que deu
espaço na 60ª edição às minorias, que dificilmente aparecem como indicadas e,
evidentemente, mais dificilmente ainda aparecem como vencedoras, como é o caso
das comédias (pouquíssimas venceram), dos atores negros (apenas 13 nomes dentre
mais de 1500 indicações conquistaram uma estatueta) e dos atores estrangeiros
(até o momento, apenas 3 venceram por interpretações em suas línguas-maternas
por filmes falados exclusivamente em língua não-inglesa).
Trata-se, a meu ver, de um ano deficiente para o Oscar.
Quando um filme tão insosso como “Nos Bastidores da Notícia” consegue lugar na
categoria máxima e ainda rende aos seus três atores centrais indicações nas
respectivas categorias, é um sinal de que algo é preocupante! A somar, ainda
sobre a categoria principal, preterir “A Era do Rádio” e “Os Intocáveis” a
títulos como “Feitiço da Lua” também indica falta de senso crítico. Não que a
comédia estrelada por Cher seja ruim, pelo contrário – mas inequivocamente some
em comparações com os filmes de Woody Allen e Brian De Palma, dois diretores
que também deveria substituir Norman Jewison e John Boorman, sendo que a este,
para mim, caberia apenas a indicação na categoria de roteiro original.
Se as categorias de Ator, Ator Coadjuvante e Atriz
Coadjuvante selaram com qualidade a premiação, entregando as estatuetas
respectivamente a Michael Douglas, Sean Connery e Olympia Dukakis, a categoria
de Melhor Atriz apresenta uma problemática ao premiar a atriz-cantora Cher:
mérito pela sua interpretação como Loretta Castorini, que, só pra constar, é
muito boa, ou o mérito é de sua longa carreira como artista da indústria
fonográfica, na qual Cher tem raízes e através da qual se tornou conhecidíssima
e respeitada como artista? Considerando as interpretações de Sally Kirkland e
Glenn Glose, ambas muito mais pungentes em suas composições do que Cher, eu
inevitavelmente penso que a Academia se confundiu, pensou que fosse o Grammy e
entregou o prêmio à carreira musical mais destacada dentre as cinco indicadas.
Essa cerimônia globalizada e estranhíssima rendeu 9
estatuetas ao filme de Bertolucci, “O Último Imperador”, e isso apenas mostra
que o filme é uma produção tipicamente vencedora da categoria principal. As
comédias, os estrangeiros e as crianças – sim, elas tiveram participação muito
notável nos indicados dessa edição – apresentam uma Academia supostamente
aberta a todas as vertentes artísticas, inclusive a música!
por Luís Adriano
Um comentário:
Belíssima memória trazida avante com essa postagem. Já conhecia o blog. Luís. Mas o convite foi oportuno nessa época de empolgação cinéfila.
1988 realmente foi um bom ano. Não acho que "O último imperador" fosse o melhor filme, mas não discordo dos escolhidos nas categorias de atuação. Até Cher eu achei justo.
Abs
Postar um comentário