segunda-feira, 30 de abril de 2012

Oscar 2002 - Opiniões (Parte 3)

A mestre de cerimônias Whoopi Goldberg no seu número de abertura, antes de
lançar comentários cômicos, como a sugestão de que até Ingmar Bergman se sentiria
depressivo se assistisse ao filme "Íris"

Essa edição de 2002 do Oscar foi realmente peculiar. Como os colegas do grupo já haviam dito, ela ficou marcada por ser a primeira edição após o ataque do 11 de setembro, a primeira em que dois negros levaram a estatueta do principal prêmio de atuação, a marcante presença de Woody Allen jamais visto até então em cerimônias da academia, o prêmio honorário para Sidney Poitier e todos esses fatos fizeram com que esta edição fosse a mais demorada de todos os tempos com mais de quatro horas de duração. E é importante ver como os americanos se unem nesses momentos difíceis, exemplo disso: a presença marcante de Allen fazendo um discurso em homenagem a cidade de Nova York, deixando aquela festa ainda mais peculiar.

O que interessa mesmo são os filmes e, nessa edição, apesar do grande contexto social que estava em torno da premiação, me surpreendi com os memoráveis títulos que pude contemplar ao longo desse mês. Acredito que 90% dos filmes analisados desta edição me agradaram por motivos diferentes, como uma boa atuação (“Íris” e “Uma lição de Amor”), um roteiro diferenciado (“Amnésia” e “Assassinato em Gosford Park”), o surgimento de um grande vencedor (“O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel”), o carisma da personagem (“O Diário de Bridget Jones”), dramas que fazem a gente pensar (“A Última Ceia” e “Entre quatro paredes”), um filme tecnicamente perfeito (“O Fabuloso Destino de Amélie Poulain”), os preferidos do público (“Moulin Rouge – Amor em Vermelho” e “Uma Mente Brilhante”), o trabalho de um gênio (“Cidade dos Sonhos”), enfim algumas dessas descrições é a simples forma de ver a qualidade dessa edição.

A lista de indicados estava muito rica quase que em todas as  categorias e em muitas deles escolher um favorito ou um vencedor não foi tarefa das mais fáceis. Em minha opinião Sean Penn e Russel Crowe foram os melhores, mas não podemos deixar de reconhecer que Denzel Washington teve um desempenho grandioso e a Academia soube reconhecer. No prêmio de Melhor Atriz, tivemos cinco nomes impecáveis em seus papéis, realmente uma escolha difícil; talvez eu ficasse com a maravilhosa interpretação de Nicole Kidman, mas, apesar de não ser tão fã da Halle Berry, é notória a beleza e força que ela desenvolveu em seu personagem para ganhar a estatueta. Não posso deixar de citar os nomes de Renée Zellweger, Judi Dench e Sissy Spacek. Como coadjuvantes, o prêmio foi mais do que merecido para Jim Broadbent e para o maravilhoso personagem vivido por Jennifer Connelly.

Não sou muito de contestar os prêmios da academia, sei da importância desse prêmio, mas sei também que muitos filmes, mesmo sem a estatueta, ficam marcados para sempre na história do cinema. Um bom exemplo disso são “Amnésia” e “Cidade dos Sonhos”. Apesar de ter gostado muito do roteiro de “Assassinato em Gosford Park”, acredito que não foi superior à história contada por Christopher Nolan. As duas histórias não são novidades, mas a forma de as contar as fazem diferentes e nesse quesito Amnésia sem duvida foi superior. Falando de direção, a Academia esta em débito com Lynch há muito tempo. Desde 1980, quando foi indicado ao prêmio por “O Homem Elefante”, David Lynch já deveria ter vencido este Oscar. Nessa edição, ele volta à disputa com mais um de seus magníficos trabalhos, deixando qualquer espectador com a cabeça revirada e cheia de perguntas sem respostas após a contemplação de Mulholland Drive. Acredito que essa derrota tenha sido mais mercadológica, haja vista que o filme não teve uma boa bilheteria e Lynch faz grandes críticas à própria indústria cinematográfica de Hollywood. Mas como isso não me interessa, criar uma história tão peculiar, diferente, utilizando a linguagem onírica e fazer com que o espectador busque suas próprias respostas, só pode ser feito por um mestre dessa arte, e Lynch é esse cara.

No mais, a vitória de  “Uma mente Brilhante” como melhor filme foi incontestável, uma história emocionante, superação do personagem, grandes atuações, um filme realmente feio para vencer o Oscar. O trabalho da equipe de Ron Howard foi magistral. Essa edição da Academia, acredito que tenha sido uma das mais ricas que já pude ver e traz consigo, sem dúvida, títulos que já estão marcados na história da sétima arte.

por Rafael Castro

domingo, 29 de abril de 2012

Oscar 2002 - Opiniões (Parte 2)


Woody Allen na única vez em que foi à cerimônia: "continuemos a fazer filmes".
Foi essa a mensagem do diretor em referência à tragédia recente enfrentada.

O Oscar 2002 aconteceu no dia 24 de março de 2002. Foi a primeira cerimônia realizada, no Kodak Theatre, em Hollywood, mais precisamente seis meses após um dos momentos definidores da história recente dos Estados Unidos: os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, em Nova York. Após este acontecimento, puderam ser notadas diversas mudanças na indústria cinematográfica norte-americana, que passou a ressaltar o seu papel de válvula de escape da população e, principalmente, de forma de arte que tenta compreender a sociedade e o mundo no qual estamos inseridos.

A noite mais importante do cinema, em 2002, também foi um reflexo direto dessa conjuntura. Tom Cruise, em um monólogo escrito por Cameron Crowe, tentando convencer os espectadores a acreditar novamente na magia do cinema, uma arte que tem o poder de reunir as pessoas em torno de algo. Uma montagem dirigida pelo documentarista Errol Morris cruzando a América, falando com as pessoas comuns, perguntando a elas o que o cinema significava para elas. Tudo, nessa noite, enfim, girou sobre a importância do cinema, notadamente o americano, em sua forma clássica, no papel fundamental que exerce para o mercado da indústria cinematográfica, como fundador das bases nas quais a indústria se ergueu.

Por incrível que pareça, o Oscar 2002 não é lembrado por essa intenção, mas sim como o show de premiação no qual um fato inédito e histórico aconteceu (e não estamos falando do fato de que esta é a cerimônia mais longa de todos os tempos, com 4h21min de duração), afinal foi nesta noite em que tivemos, pela primeira vez na história da premiação, a vitória de dois atores negros nas principais categorias de atuação. Denzel Washington conquistou a sua segunda estatueta pela performance como o policial corrupto de “Dia de Treinamento” e Halle Berry se tornou a primeira atriz negra a vencer o Oscar da categoria pela belíssima atuação em “A Última Ceia”. Para completar o triunfo desses dois atores, ainda tínhamos Sidney Poitier (o primeiro ator negro vencedor do Oscar da categoria pela performance em “Uma Voz nas Sombras”, de 1963) ganhando um Oscar honorário pelo conjunto de sua obra profissional.

Coincidências à parte, o Oscar 2002 foi um dos shows de premiações mais interessantes dos anos recentes, com ótimas montagens (destaque para a rara aparição de Woody Allen apresentando uma montagem dirigida por Nora Ephron em homenagem aos filmes produzidos na cidade de Nova York e ao tributo feito por John Williams em homenagem às trilhas sonoras mais clássicas do cinema) e momentos deveras inesquecíveis, que, de uma forma ou de outra, acabam ressaltando justamente o mote principal do show desse ano: marcar - e reforçar - a ideia de que o Oscar estava voltando para casa (a cidade de Hollywood, capital da sétima arte) depois de mais de 40 anos. 

por Kamila Azavedo

Uma das brincadeirinhas da Academia: como 2002 foi o primeiro ano em que se
premiou um filme de animação numa categoria específica, nada mais simpático que misturar os
personagens do filme vencedor junto com o público, que aplaudiu o ogro e o burrinho do filme "Shrek"
PSICOLOGIA REVERSA: EVOLUÇÃO DISFARÇANDO RETROCESSO
Quando penso na septuagésima quarta edição do Oscar, antes mesmo de pensar na qualidade dos filmes indicados e dos filmes vencedores, inequivocadamente penso no fato de que Denzel Washington e Halle Berry venceram nas categorias principais de atuação; Whoopi Goldberg apresentou a cerimônia e Sidney Poitier foi o ator homenageado com o prêmio honorário devido a sua “[...] extraordinary performances and unique presence on the screen and for representing the industry with dignity, style and intelligence”. O que eles todos têm em comum: são negros. O que a cerimônia têm de incomum: negros não costumam ser laureados, muito menos é usual que mais de negro tenha presença marcada tão fortemente numa cerimônia.
 Aí fica a grande a questão: os holofotes voltados para esses intérpretes se referiam à qualidade de seus trabalhos nos filmes específicos pelos quais concorreram; pelas suas filmografias, de um modo geral; ou, ainda, para fazer justiça com os poucos negros que foram indicados e, não por menos, pelos pouquíssimos que ganharam? Em seu texto, Marcelo disse algo que é interessante: os filmes não foram tão marcantes. Talvez o mais chamativo seja “Cidade dos Sonhos”, que rendeu uma única indicação a David Lynch como Melhor Diretor, justamente por causa das suas particularidades que fazem do filme uma obra de referência. Também “Moulin Rouge – Amor em Vermelho”, que reavivou o gênero musical e notadamente se difere dos outros indicados pelo seu arrojo fílmico, sua extravagância que, felizmente, não o torna exagerado.
Quanto a Halle Berry, igual ao Levi, não a considero grande atriz, não tenho grande interesse em suas atuações – mas inegavelmente “A Última Ceia” é o seu grande momento cinematográfico. Aliás, todas as atrizes indicadas estavam num momento excepcional, desde Sissy Spacek, que é mais coadjuvante do que protagonista, até Renée Zellweger, cuja personagem é firmemente defendida por uma atriz que apresenta boas nuances entre o cômico e o dramático. Quanto a Nicole Kidman, um verdadeiro espetáculo no filme pelo qual foi indicado, trata-se de uma das interpretações que mais me cativam, mas ainda assim acho que ela e Berry, qualquer que ganhasse, não seria injusto. Elucidado o caso quanto às atrizes, vêm os atores: a minha impressão é que Denzel Washington venceu justamente para fazer par à atriz vencedora, porque, ainda que muito boa, a sua interpretação como o extrovertido Alonzo Harris me soa inferior à interpretação de Rusell Crowe como o introvertido John Nash.
“Uma Mente Brilhante” é um filme de Oscar, desses bem calculados para levar o prêmio principal, o que acabou acontecendo. Conhecemos o conservadorismo da Academia, era se de supor que o filme mais reacionário (ainda que eficiente em sua carga dramática) ganhasse o prêmio principal. Nem mesmo a ostentação dos efeitos especiais em “O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel” o tornam menos reacionário nem o grand finale de “Entre Quatro Paredes” fazem dele mais inovador, apesar de os atores realmente surpreendem do começo ao fim, em especial Marisa Tomei notadamente mais interessante que Jennifer Connelly. Para mim, o grande vencedor da noite seria o filme de Baz Luhrmann, o musical com Nicole Kidman, muito mais pungente que o regrado e cartilhado filme de Ron Howard, cujo Oscar conquistado pareceu apenas reforçar a intenção da Academia de assegurar que Hollywood não fugisse ao controle, principalmente após o 11 de Setembro.
Fico pensando no quanto os ataques do ano anterior influenciaram a cerimônia de 2002. Até mesmo Woody Allen, que nunca compareceu a um evento de premiação da Academia, estava presente. Penso que, em grande parte, as escolhas da Academia tenham sido, mais do que por merecimento (ainda que em alguns casos houvesse assimilação entre o prêmio e a qualidade artística), por moralismo controlador, basta observar as características do vencedores, desde a filosofia do “amor salva tudo” em “Uma Mente Brilhante” até a queda da corrupção na figura de Alonzo Harris em “Dia de Treinamento”. Ao começar a analisar a 74ª edição do Oscar, pensei que a grande discussão seria a questão do racismo disfarçado, mas terminei com a sensação de que o problema foi a valorização do moralismo.
por Luís Adriano de Lima
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