sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Oscar 1952 - Opiniões (parte 1)

Montgomery Clift e Elizabeth Taylor em A Place in the Sun.

Quem já assistiu a “Uma Rua Chamada Pecado” sabe que, além da grande história - fruto do gênio criativo de Tennessee Williams -, o filme, dirigido por Elia Kazan, tornou-se célebre por eternizar duas das maiores interpretações do cinema:  Marlon Brando e o seu macho-alfa Stanley Kowalski; Vivian Leigh e sua histriônica Blanche DuBois. Agora, multiplique isso por meia dúzia de atuações tão intensas quanto e terá o panorama da edição de 1952 dos Academy Awards.  Não seria leviano, portanto, afirmar que este foi um ano de grandes e célebres atuações.

Brando não levou - fato.  Naquela noite, a estatueta foi parar nas mãos do já veterano Humphrey Bogart.  Mas também poderia ter ido enfeitar a estante de Montgomery Clift, que deu vida ao atormentado George Eastman, por exemplo. Vivien Leigh, na ala feminina, arrebatou a Academia e se sobrepôs a nomes como Shelley Winters e a sempre favorita Katharine Hepburn. Nas categorias secundárias de atuação, o mesmo se deu.  Resumo da ópera: definitivamente, esse não foi um ano fácil.

Na categoria Melhor Filme, grandes dramas concorriam ao prêmio.  Havia de tudo: prisioneiros alemães espionando e colhendo informações, rapazes ambiciosos querendo subir na vida e esquecendo dos métodos anticoncepcionais e até a história de amor entre um tribuno romano e uma jovem cristã.  Quem levou a melhor, entretanto, foi um musical, ambientado em Paris, que foi o début de uma das mais charmosas atrizes de todos os tempos: Leslie Caron. 

Particularmente, meu preferido dessa edição é “Um Lugar Ao Sol”.  Nada contra o gênero musical, muito pelo contrário, mas não consegui enxergar em "Sinfonia em Paris" qualidades suficientes para ser escolhido como “o melhor” daquele ano.  De qualquer forma, creio que justiça ao longa foi feita quando George Stevens recebeu o prêmio de melhor realizador. Era a consagração de uma carreira que colecionou sucessos como “Assim Caminha a Humanidade“ (1956), “O Diário de Anne Frank” (1959) e “A Maior História de Todos Os Tempos“ (1965).

por Marcelo Antunes

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Kirk Douglas, não-nominado, e Eleanor Parker, que concorreu como Melhor Atriz,
em cena do filme Detective Story, de William Wyler.

A FANTASIA EM DETRIMENTO DA REALIDADE

Curioso notar que a Academia tem uma paixão não assumida pelos grandes dramas. Ainda que premie vez ou outra uma comédia, é muito mais comum que as narrativas que abordem situações numa vertente dramática – e principalmente num enredo de superação – sejam as grandes laureadas com o prêmio de Melhor Filme. E, mais curioso ainda, é perceber a receptividade dela ao musical “Sinfonia de Paris”, filme dirigido por Vincente Minelli que arrebatou a estatueta máxima na noite de 20 de março de 1952. Essa introdução serve para ressaltar o quanto é estranho ver que os membros da Academia, tão envoltos pelo clima melodramático de muitas películas, acabaram – contraditoriamente – premiando um filme musical no qual a fantasia prevalece, ainda que, inevitavelmente, se discorra também sobre as relações humanas num plano mais palpável: o da vida real.

E filmes realistas não faltaram no ano de 1952. Como adendo, vale comentar que todos os títulos indicados na categoria principal – à exceção do vencedor – traziam em seu enredo uma abordagem ontológica interessantíssima. “Uma Rua Chamada Pecado” percorre o caminho do amargor e do ressentimento entre Kowalski e Blanche, bem como da paixão arrebatadora e violenta entre a personagem de Brando e a de Kim Hunter. “Um Lugar ao Sol” discorre, sem meias palavras, o ato do perjúrio e a vontade irrefreável de conquistar tudo aquilo que se acredita seu por direito – vemos a ambição tomar o lugar da sensatez e, consequentemente, a destruição física e moral das personagens. “Quo Vadis”, uma lírica epopeica cinematográfica acerca daquilo que mais comumente se encontra na natureza humana: o amor e a guerra. E, falando em guerra, havia uma ferida recente a ser analisada, por isso o thriller “Decisão Antes do Amanhecer”, que nos mostra a relação de dois lados da Segunda Guerra Mundial: os americanos e os alemães em contato direto.

E pensar que a miscelânea ontológica para na categoria de Melhor Filme é bobagem, porque há ainda outros grandiosos títulos que discorrem sobre a natureza humana: a obstinação cega em “Chaga de Fogo”, a crença alienada em “A Morte do Caixeiro-Viajante”, a tolerância resignada fundida em atração em “Uma Aventura na África”. Tudo isso nos mostra que a Academia deveria olhar com maior atenção essas películas em vez de simplesmente conceder a uma obra de caráter tão duvidosamente onírico e que, apesar de divertida, não consegue promover o nível de discussão enquanto objeto artístico de qualquer outro filme com o qual concorria. Chega a ser assombroso pensar que nem “Uma Rua Chamada Pecado” nem “Um Lugar ao Sol” levaram o prêmio. Concordo que o primeiro é bastante teatral se não e assimila tanto ao cinema como a obra de George Stevens faz, mas, ainda assim, se trata de uma produção superior à “Sinfonia de Paris”, que, digo sem receios, lhe roubou o prêmio.

A irreverência de George Stevens lhe rendeu merecidamente o reconhecimento como o melhor diretor, afinal ele realmente mostrou algo diferente, seja na técnica de filmagem – planos menos teatrais, cortes mais rápidos -, seja no cuidado artístico: “Um Lugar ao Sol” é um prazer de se ver. Já a atenção de Elia Kazan com seus atores rendeu a todos indicações e, merecidamente, a três deles o prêmio. Mas para mim, o grande filme da edição é “Chaga de Fogo”, que merecia muito mais do que apenas as quatro indicações que recebeu. Acredito facilmente que esse filme chegaria à categoria máxima e se consagraria o melhor filme, assim como Kirk Douglas, houvesse sido indicado, seria nominado melhor ator – talvez seja, salvo seu debate sociológico, o filme mais ousado de 1952 e, a meu ver, o que mais merecia reconhecimentos em vez da obra fantasiosa e superficial dirigida por Minelli.

por Luís Adriano de Lima

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