quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Oscar 1952 - Uma Rua Chamada Pecado

Esta, que é provavelmente uma das maiores obras do cinema, abre a década de 1950 e concorre a nada menos do que 12 estatuetas, sendo vencedor em 4 categorias. A obra de Elia Kazan nos traz a história de Blanche DuBois, um professora de inglês que vai visitar a irmã e o cunhado após um longo tempo sem vê-los. A chegada de Blanche causa transtorno à família Kowalski: ainda que Stella esteja muito contente com a vinda da irmã, Stanley, seu marido, se opõe veemente à permanência da cunhada e começa a se questionar o porquê da presença repentina dela.

Os problemas da família aumentam conforme a relação entre os personagens se expande: Blanche, interpretada por Vivien Leigh, se envolve com Mitch (Karl Malden), amigo de Stanley, que se vê obrigado a perturbar essa relação semeando a discórdia entre a cunhada e o amigo - e isso inevitavelmente resulta no desentendimento entre ele e Stella. Pouco a pouco, o filme percorre uma excelente análise ontológica - conhecemos o ciúme e a raiva de Stanley, a inveja e a dúvida de Blanche, a personalidade gentil e sempre caridosa de Stella além de um Mitch totalmente perturbado pelo seu sentimento por Blanche.

Ainda a obra implicita temas bastante polêmicos, como o adultério, que vemos na imagem da tensão sexual sempre crescente entre Stanley e Blanche; a homossexualidade, como depreendemos pelo diálogo entre Blanche e Mitch, quando ela conta sobre como seu parceiro morreu; além da própria alegoria do título e das cenas, que já nos revelam algo extremamente importante: o bonde chamado Desejo (“a streetcar named desire”) leva à rua chamada Cemitério - ou seja, o desejo extremo leva indubitavelmente à morte. E o que vemos é uma morte gradual de todos os personagens, que, incapazes de lidar com as relações humanas, vêem-nas sendo pouco a pouco destruídas.

A obra de Tennessee Williams, escrita e lançada originalmente em 1947, foi apresentada nos palcos entre dezembro de 1947 e dezembro de 1949, tendo como atores os mesmos intérpretes do filme, salvo Vivien Leigh, que interpretou Blanche nos teatros londrinos, cabendo à Jessica Tandy a personagem nos palcos americanos. Elia Kazan ficou responsável pela direção teatral e pela direção cinematográfica e o próprio autor da peça ajudou a transformá-la num filme, que acabou sendo filmado em apenas 36 dias. Todo o esforço dos atores e da equipe de filmagem fez com que essa película se tornasse uma das mais potentes obras cinematográficas, abordando eficientemente a dominação da classe aristocrática (Blanche) sobre a classe operária (Stanley), além de apresentar em ironia a decadência do teatro melodramático, visto na figura da protagonista, sempre cheia de expressões exageradas e de frases de impacto, sendo uma delas, aliás, a que mais marca esse filme: “[...] seja você quem, eu sempre dependi da bondade de estranhos”.

PERFIL: KIM HUNTER
Kim Hunter, cujo verdadeiro nome é Janet Cole, nasceu em Detroit, em 1922. Em 1939, aos 17 anos, quando estava no final do curso médio, apareceu pela primeira vez numa produção teatral, chamada Penny Wise, que atrairia os olhares de produtores que mais tarde a convidariam para trabalhar no cinema também. O seu filme de estréia foi The Seventh Victim, de 1943, mas passou praticamente toda a década de 1940 nos palcos, onde, em 1947, deu vida à personagem Stella Kowalski na realização da peça “Um Bonde Chamado Desejo”, de Tennessee Williams.

A década de 1950 começou extremamente positivo para a atriz, mas logo se mostrou uma época difícil para ela. Em 1951, ela reprisou no cinema o papel de sra. Kowalski no filme “Uma Rua Chamada Pecado”, que acabaria lhe rendendo dois importantes prêmios cinematográficos: o Globo de Ouro e o Oscar, ambos na categoria de Melhor Atriz Coadjuvante. O comunismo assombrava os Estados Unidos naquele momento e todos viviam o temor do macartismo, que patrulhava os estúdios à procura de nomes da indústria do entretenimento que estavam relacionados ao comunismo. Devido à informação dada por Elia Kazan, o diretor de “Uma Rua Chamada Pecado”, o nome de Kim Hunter surgiu na lista negra - aquela que listava os nomes dos profissionais que ficariam desempregados dada a sua aliança político-econômica - e isso fez com que ela não conseguisse voltar às telas até o ano de 1957, depois de a Era McCarthy já estar em extrema decadência e, inclusive, o precursor - Joseph McCarthy - estar morto. Nesse meio tempo, a ganhadora do Oscar trabalhou em atuações menores, percorrendo o país em atuações teatrais e fazendo pequenas participações em seriados de TV.

Ainda que sua atuação no filme Lilith (1964) ser considerada uma de suas melhores, foi Dr. Zira, a sua personagem no filme “O Planeta dos Macacos” (1968) que a levou à fama, fazendo com que ela também aparecesse nas continuações, “De Volta ao Planeta dos Macacos” (1970) e “A Fuga do Planeta dos Macacos” (1971). Apesar de sua verdadeira predileção ser o teatro, Hunter apareceu em muitos filmes - um dos seus últimos papéis de destaque foi em “Meia-noite no Jardim do Bem e do Mal” (1997) - e também apareceu em séries de TV, tendo inclusive concorrido ao Emmy Awards por The Edge of the Night (1979). Toda a sua carreira lhe concedeu duas estrelas na calçada da fama: uma pelo seu desempenho televisivo e outra pelo seu desempenho cinematográfico. Sua morte aconteceu exatamente um ano após os ataques ao World Trade Center, em 11 de setembro de 2002, devido ao um ataque cardíaco aos 79 anos de idade.

CURIOSIDADES:

- É o primeiro de dois filmes (o segundo seria “Rede de Intrigas” [1976]) a ter três atores consagrados nas categorias de atuação.

- Jessica Tandy, que interpretou Blanche DuBois na Broadway juntamente com Brando, Hunter e Malden, foi substituída por Vivien Leigh porque esta atrairia mais o público por já ser bastante famosa.

- Apesar de o filme ser bastante similar à peça teatral, dois elementos foram severamente diminuídos, um deles desaparecendo, enquanto um foi totalmente modificado. Na peça, quando confessa a Mitch o porquê da morte de seu jovem marido, Blanche fala que o encontrou na cama com outro homem e ficou histérica; por nem sequer ter tentado compreendê-lo, o rapaz se matou. No filme, a alusão a esse elemento é pequena e bastante implícita. Na peça, há implicitamente um estupro, quando Stanley finalmente cedeu ao impulso sexual, agarrando Blanche e jogando-a à cama; no filme isso foi evidentemente removido pelo Código Moral e pelas entidades cristãs da indústria cinematográfica. O terceiro elemento é o final, no qual Stanley e Stella terminam separados, devido ao fato de ele ter feito mal à cunhada - como o estupro não acontece no filme, o casal termina junto após Blanche ser levada a um instituto psiquiátrico devido à sua esquizofrenia.

- Vivien Liegh, que atuou com Blanche na peça londrina sob a direção do seu então marido, Laurence Olivier, disse que sua interpretação se deve mais ao trabalho com Olivier do que com Kazan, o diretor do filme que rendeu a ela seu segundo Oscar.

- A fala “I have always depende don the kidness of strangers”, proferida por Blanche DuBois no final da obra, foi eleita a 75ª frase mais famosa de cinema enquanto a fala “Stella! Hey Stella!”, proferida por Stanley Kowalski à Stella, foi eleita a 45ª mais famosa pelo AFI (American Film Institute), cabendo ao filme, em 2007, também pelo AFI, a 47ª posição como “melhor filme de todos os tempos”.

- O apartamento dos Kowalski vai diminuindo conforme o filme progride a fim de aproximar a visão do espectador da visão de Blanche, que sofre de claustrofobia.

- Houve, a princípio, tensão entre Vivien Leigh e Marlon Brando: ela o achava afetado demais enquanto ele a achava muito difícil para se trabalhar com. Pouco tempo depois, antes da metade das gravações, os dois já haviam se tornado amigos e as filmagens aconteciam harmoniosamente.

INDICAÇÕES (4 vitórias):
1. Melhor Filme: Charles K. Feldman
2. Melhor Diretor: Elia Kazan
3. Melhor Ator: Marlon Brando
4. Melhor Atriz: Vivien Leigh (venceu)
5. Melhor Ator Coadjuvante: Karl Malden (venceu)
6. Melhor Atriz Coadjuvante: Kim Hunter (venceu)
7. Melhor Roteiro Adaptado: Tennessee Williams
8. Melhor Fotografia em Preto e Branco: Harry Stradling Sr.
9. Melhor Figurino em Preto e Branco: Lucinda Ballard
10. Melhor Direção de Arte em PB: Richard Day e George Hopkins (venceu)
11. Melhor Mixagem de Som: Nathan Levinson
12 Melhor Trilha Sonora: Alex North

Nenhum comentário:

diHITT - Notícias