Esta, que é provavelmente uma das maiores obras do cinema,
abre a década de 1950 e concorre a nada menos do que 12 estatuetas, sendo
vencedor em 4 categorias. A obra de Elia Kazan nos traz a história de Blanche
DuBois, um professora de inglês que vai visitar a irmã e o cunhado após um
longo tempo sem vê-los. A chegada de Blanche causa transtorno à família
Kowalski: ainda que Stella esteja muito contente com a vinda da irmã, Stanley,
seu marido, se opõe veemente à permanência da cunhada e começa a se questionar
o porquê da presença repentina dela.
Os problemas da família aumentam conforme a relação entre
os personagens se expande: Blanche, interpretada por Vivien Leigh, se envolve
com Mitch (Karl Malden), amigo de Stanley, que se vê obrigado a perturbar essa
relação semeando a discórdia entre a cunhada e o amigo - e isso inevitavelmente
resulta no desentendimento entre ele e Stella. Pouco a pouco, o filme percorre
uma excelente análise ontológica - conhecemos o ciúme e a raiva de Stanley, a inveja
e a dúvida de Blanche, a personalidade gentil e sempre caridosa de Stella além
de um Mitch totalmente perturbado pelo seu sentimento por Blanche.
Ainda a obra implicita temas bastante polêmicos, como o
adultério, que vemos na imagem da tensão sexual sempre crescente entre Stanley
e Blanche; a homossexualidade, como depreendemos pelo diálogo entre Blanche e
Mitch, quando ela conta sobre como seu parceiro morreu; além da própria
alegoria do título e das cenas, que já nos revelam algo extremamente
importante: o bonde chamado Desejo (“a
streetcar named desire”) leva à rua
chamada Cemitério - ou seja, o desejo extremo leva indubitavelmente à
morte. E o que vemos é uma morte gradual de todos os personagens, que,
incapazes de lidar com as relações humanas, vêem-nas sendo pouco a pouco
destruídas.
A obra de Tennessee Williams, escrita e lançada
originalmente em 1947, foi apresentada nos palcos entre dezembro de 1947 e
dezembro de 1949, tendo como atores os mesmos intérpretes do filme, salvo
Vivien Leigh, que interpretou Blanche nos teatros londrinos, cabendo à Jessica
Tandy a personagem nos palcos americanos. Elia Kazan ficou responsável pela
direção teatral e pela direção cinematográfica e o próprio autor da peça ajudou
a transformá-la num filme, que acabou sendo filmado em apenas 36 dias. Todo o
esforço dos atores e da equipe de filmagem fez com que essa película se
tornasse uma das mais potentes obras cinematográficas, abordando eficientemente
a dominação da classe aristocrática (Blanche) sobre a classe operária (Stanley),
além de apresentar em ironia a decadência do teatro melodramático, visto na
figura da protagonista, sempre cheia de expressões exageradas e de frases de
impacto, sendo uma delas, aliás, a que mais marca esse filme: “[...] seja você
quem, eu sempre dependi da bondade de estranhos”.
PERFIL: KIM HUNTER
Kim Hunter, cujo verdadeiro nome é Janet Cole, nasceu em
Detroit, em 1922. Em 1939, aos 17 anos, quando estava no final do curso médio,
apareceu pela primeira vez numa produção teatral, chamada Penny Wise, que atrairia os olhares de produtores que mais tarde a
convidariam para trabalhar no cinema também. O seu filme de estréia foi The Seventh Victim, de 1943, mas passou
praticamente toda a década de 1940 nos palcos, onde, em 1947, deu vida à
personagem Stella Kowalski na realização da peça “Um Bonde Chamado Desejo”, de
Tennessee Williams.
A década de 1950 começou extremamente positivo para a
atriz, mas logo se mostrou uma época difícil para ela. Em 1951, ela reprisou no
cinema o papel de sra. Kowalski no filme “Uma Rua Chamada Pecado”, que acabaria
lhe rendendo dois importantes prêmios cinematográficos: o Globo de Ouro e o
Oscar, ambos na categoria de Melhor Atriz Coadjuvante. O comunismo assombrava
os Estados Unidos naquele momento e todos viviam o temor do macartismo, que
patrulhava os estúdios à procura de nomes da indústria do entretenimento que
estavam relacionados ao comunismo. Devido à informação dada por Elia Kazan, o
diretor de “Uma Rua Chamada Pecado”, o nome de Kim Hunter surgiu na lista negra
- aquela que listava os nomes dos profissionais que ficariam desempregados dada
a sua aliança político-econômica - e isso fez com que ela não conseguisse
voltar às telas até o ano de 1957, depois de a Era McCarthy já estar em extrema
decadência e, inclusive, o precursor - Joseph McCarthy - estar morto. Nesse
meio tempo, a ganhadora do Oscar trabalhou em atuações menores, percorrendo o
país em atuações teatrais e fazendo pequenas participações em seriados de TV.
Ainda que sua atuação no filme Lilith (1964) ser
considerada uma de suas melhores, foi Dr. Zira, a sua personagem no filme “O
Planeta dos Macacos” (1968) que a levou à fama, fazendo com que ela também
aparecesse nas continuações, “De Volta ao Planeta dos Macacos” (1970) e “A Fuga
do Planeta dos Macacos” (1971). Apesar de sua verdadeira predileção ser o
teatro, Hunter apareceu em muitos filmes - um dos seus últimos papéis de
destaque foi em “Meia-noite no Jardim do Bem e do Mal” (1997) - e também
apareceu em séries de TV, tendo inclusive concorrido ao Emmy Awards por The
Edge of the Night (1979). Toda a sua carreira lhe concedeu duas estrelas na
calçada da fama: uma pelo seu desempenho televisivo e outra pelo seu desempenho
cinematográfico. Sua morte aconteceu exatamente um ano após os ataques ao World
Trade Center, em 11 de setembro de 2002, devido ao um ataque cardíaco aos 79
anos de idade.
CURIOSIDADES:
- É o primeiro de dois filmes (o segundo seria “Rede de
Intrigas” [1976]) a ter três atores consagrados nas categorias de atuação.
- Jessica Tandy, que interpretou Blanche DuBois na
Broadway juntamente com Brando, Hunter e Malden, foi substituída por Vivien
Leigh porque esta atrairia mais o público por já ser bastante famosa.
- Apesar de o filme ser bastante similar à peça teatral,
dois elementos foram severamente diminuídos, um deles desaparecendo, enquanto
um foi totalmente modificado. Na peça, quando confessa a Mitch o porquê da
morte de seu jovem marido, Blanche fala que o encontrou na cama com outro homem
e ficou histérica; por nem sequer ter tentado compreendê-lo, o rapaz se matou.
No filme, a alusão a esse elemento é pequena e bastante implícita. Na peça, há
implicitamente um estupro, quando Stanley finalmente cedeu ao impulso sexual,
agarrando Blanche e jogando-a à cama; no filme isso foi evidentemente removido
pelo Código Moral e pelas entidades cristãs da indústria cinematográfica. O
terceiro elemento é o final, no qual Stanley e Stella terminam separados,
devido ao fato de ele ter feito mal à cunhada - como o estupro não acontece no
filme, o casal termina junto após Blanche ser levada a um instituto
psiquiátrico devido à sua esquizofrenia.
- Vivien Liegh, que atuou com Blanche na peça londrina sob
a direção do seu então marido, Laurence Olivier, disse que sua interpretação se
deve mais ao trabalho com Olivier do que com Kazan, o diretor do filme que
rendeu a ela seu segundo Oscar.
- A fala “I have always depende don the kidness of
strangers”, proferida por Blanche DuBois no final da obra, foi eleita a 75ª
frase mais famosa de cinema enquanto a fala “Stella! Hey Stella!”, proferida
por Stanley Kowalski à Stella, foi eleita a 45ª mais famosa pelo AFI (American
Film Institute), cabendo ao filme, em 2007, também pelo AFI, a 47ª posição como
“melhor filme de todos os tempos”.
- O apartamento dos Kowalski vai diminuindo conforme o
filme progride a fim de aproximar a visão do espectador da visão de Blanche,
que sofre de claustrofobia.
- Houve, a princípio, tensão entre Vivien Leigh e Marlon
Brando: ela o achava afetado demais enquanto ele a achava muito difícil para se
trabalhar com. Pouco tempo depois, antes da metade das gravações, os dois já
haviam se tornado amigos e as filmagens aconteciam harmoniosamente.
INDICAÇÕES
(4 vitórias):
1. Melhor
Filme: Charles K. Feldman
2. Melhor
Diretor: Elia Kazan
3. Melhor
Ator: Marlon Brando
4. Melhor
Atriz: Vivien Leigh (venceu)
5. Melhor
Ator Coadjuvante: Karl Malden (venceu)
6. Melhor
Atriz Coadjuvante: Kim Hunter (venceu)
7. Melhor
Roteiro Adaptado: Tennessee Williams
8. Melhor
Fotografia em Preto e Branco: Harry Stradling Sr.
9. Melhor
Figurino em Preto e Branco: Lucinda Ballard
10.
Melhor Direção de Arte em PB: Richard Day e George Hopkins (venceu)
11.
Melhor Mixagem de Som: Nathan Levinson
12 Melhor
Trilha Sonora: Alex North
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